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Nem tudo que se vê é o que parece: reflexões sobre a atualização do valor do imóvel para fins de imposto de renda

A Lei nº 14.973/24 trouxe a possibilidade de atualização do custo de aquisição dos bens imóveis de pessoas físicas e jurídicas a uma carga tributária “atraente”, mas será que vale a pena?

 

Na busca de mais arrecadação para compensar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento para alguns setores da economia até 2027, imbróglio jurídico que se arrastava desde o final do ano passado esse sentido, foi publicada a Lei nº 14.973, em 16 de setembro de 2024, que trouxe, dentre outros temas, a possibilidade de atualização do valor de bens imóveis.

Com a publicação da indigitada lei, o governo federal divulgou nota exaltando a permissão da Receita Federal para “atualização do custo dos bens imóveis a valor de mercado”, a uma carga tributária reduzida e mais “benéfica” de 4%, ao invés de 15% a 22,5%, para pessoas físicas; ou de 10%, ao invés de 34%, para pessoas jurídicas. A notícia da “oportunidade” foi logo replicada massivamente pela mídia em geral.

No final do mês de setembro passado, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.222/2024, fixando o prazo para a atualização do valor dos bens imóveis até 16/12/2024, com a regulamentação e outros detalhes importantes para melhor avaliação dessa possível benesse fiscal.

Mas afinal, seria essa uma oportunidade de economia tributária?

Eis a questão... situações complexas não permitem respostas singelas, como veremos adiante.

De início, verifica-se que eventual benefício dependerá substancialmente da futura destinação do imóvel a ser objeto de potencial atualização, pois, em caso de alienação (venda) antes do longuíssimo prazo de 15 anos dessa atualização, haverá a necessidade de pagamento de tributação complementar, com valor decrescente em função do tempo, de acordo com o percentual previsto na legislação.

Para melhor ilustrar, imaginemos uma pessoa física que tenha um imóvel informado em sua declaração de imposto de renda e optará pela atualização do valor declarado desse imóvel a mercado (valor que o próprio contribuinte deve atribuir), com o recolhimento do IR à alíquota de 4% sobre a diferença entre o valor declarado como custo de aquisição e o valor a ser atualizado, o chamado “ganho de capital”.

Vejamos um exemplo com números para melhor compreensão, sendo o valor do custo de aquisição do imóvel declarado na DIRPF de R$ 500 mil, com valor da atualização pela Lei nº 14.973/24, no mês de dezembro/2024, atribuído para R$ 1 milhão, resultando em um ganho de capital de R$ 500 mil. O valor de alienação futura seria também de R$ 1 milhão, para simplificar as contas:

* Havendo alienação do imóvel objeto de atualização de seu custo de aquisição antes do prazo de 15 anos, necessário o recolhimento de tributos sobre o ganho de capital ajustado pela fórmula: GK = valor da alienação - [CAA + (DTA x %)], sendo GK o ganho de capital ajustado, CAA o custo de aquisição antes da atualização e DTA a diferença entre o valor do imóvel atualizado e o seu CAA.

Na situação acima, considerando a necessidade de se recolher IR adicional à alíquota de 15% sobre o ganho de capital “ajustado” pelo prazo de alienação, verificamos que para a venda do imóvel no período de até 6 anos da atualização, haverá o recolhimento a maior de IR, à carga decrescente de 19% a 15,40%, ou seja, a alíquota efetiva do IRPF será maior que a “normal” de 15%. Apenas após dezembro/2030, portanto, começará a haver alguma economia tributária, em termos nominais, com redução gradual da carga efetiva do IR, atingindo 4% somente após dezembro/2039.

A pessoa jurídica também poderá atualizar o valor do bem imóvel constante no seu ativo não circulante e tributar o ganho de capital, que corresponderá à diferença entre o valor atualizado e o custo de aquisição reduzido pela depreciação, a uma carga de 10%, sendo 6% de IRPJ e 4% de CSLL.

Como exemplo, temos um imóvel com valor contábil de R$ 500 mil, atualizado para R$ 1 milhão em dezembro/24, com ganho de capital de R$ 500 mil. O valor da alienação futura seria igual ao da atualização:

* Havendo alienação do imóvel objeto de atualização de seu custo de aquisição antes do prazo de 15 anos, necessário o recolhimento de tributos sobre o ganho de capital ajustado pela fórmula: GK = valor da alienação - [CAA + (DTA x %)], sendo GK o ganho de capital ajustado, CAA o custo de aquisição antes da atualização e DTA a diferença entre o valor do imóvel atualizado e o seu CAA.

Para a pessoa jurídica, também verificamos que, havendo a venda do imóvel em até 6 anos contados da atualização, a carga tributária final de IR/CS variará de forma decrescente de 44% a 35,84%, acima da carga “normal” de 34%, e que eventual economia tributária ocorrerá, em termos nominais, apenas após dezembro/2030, com redução gradual da carga efetiva do IR/CS, atingindo 10% somente após dezembro/2039.

Se considerarmos, ainda, em ambos os casos, que o valor desembolsado hoje para pagamento desse “adiantamento” de tributos será maior quando ajustado a valor futuro, na data da alienação, o início da economia tributária será postergada em 2 a 3 anos, com carga efetiva final bem maior que a projetada nominalmente.

Além do exercício de “futurologia” acima explanado, algumas outras situações excluem ou interferem na opção pela atualização da Lei nº 14.973/24.


Por exemplo, a venda do único imóvel da pessoa física no valor de até R$ 440 mil; a alienação de imóveis antigos adquiridos até 1969; ou a aplicação dos recursos oriundos da venda em outro imóvel residencial no prazo de 180 dias, são situações não tributadas pelo IR, não havendo que se falar em atualização do valor do imóvel.  


Em outra banda, temos situações em que a legislação do IR prevê redução do ganho de capital e, por consequência, do IRPF a ser recolhido para imóveis adquiridos a partir de 1970, o que também deve ser considerado.


Vejamos algumas situações que permitem a aplicação dos redutores da Lei nº 11.196/2005, utilizando os mesmos dados anteriores:

* A presente análise não considera a aplicação desses fatores de redução em caso de atualização do valor dos imóveis pela Lei nº 14.973/24, tendo em vista a redação confusa do § 1º do artigo 12 da IN RFB nº 2.222/24, os quais, se aplicáveis, podem trazer alguma vantagem para essa nova legislação.

Verificamos que para um imóvel adquirido em 1998, a economia tributária na venda efetuada nos mesmos períodos futuros seria maior que a trazida pela Lei nº 14.973/2024. Se o imóvel fosse adquirido em 2010, o benefício seria maior em todos os períodos e praticamente se igualaria em 2039, em termos nominais. Justificaria atualizar esses imóveis pela nova legislação?


Portanto, podemos perceber que os benefícios trazidos pela nova legislação não se descortinam automaticamente e dependem da análise do caso concreto, sendo favorável, talvez, nas ocasiões em que o imóvel tenha sido adquirido em período mais recente; ou o ganho de capital seja tributado a alíquotas maiores de IRPF; ou, ainda, o imóvel seja sede de pessoa jurídica que não tenha perspectiva de venda no longo prazo.


Outras situações merecem atenção, como a possibilidade de reclassificação contábil de imóveis em empresas patrimoniais optantes pelo lucro presumido; a venda de imóveis rurais, que pode ter seu ganho de capital apurado com base no valor da terra nua (VTN); a discussão sobre a contabilização da atualização do valor do imóvel com o consequente incremento do patrimônio líquido da empresa, que pode impactar o custo do ITCMD em futura transmissão não onerosa ou por herança das cotas sociais; ou ainda a integralização de bens imóveis dos sócios com valor atualizado em holding patrimonial, com possíveis efeitos sobre a cobrança do ITBI.


Ao que se vê, diante dos múltiplos aspectos a influenciar eventual eficiência tributária na operação de atualização do valor de bens imóveis, fundamental a avaliação cautelosa antes da tomada de decisão.


Nossa área de Direito Tributário permanece à disposição para esclarecimentos sobre este e outros temas de interesse de seus clientes e parceiros. Veja a matéria em nosso LinkedIn: https://www.linkedin.com/posts/michel-bosso-5b377524a_nem-tudo-que-se-v%C3%AA-%C3%A9-o-que-parece-reflex%C3%B5es-activity-7250255085803364352-kOue?utm_source=share&utm_medium=member_desktop

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